Ela cantava alegremente qualquer coisa sobre o fim dos tempos quando chegou. Da beirada, conseguia ver o impacto causado pela explosão ocorrida no começo da tarde. A enorme e funda cratera era uma réplica perfeita das representações da queda de um meteoro, exceto pelo único detalhe que diferenciava a realidade dos livros de história: no centro do gigantesco buraco, onde antes havia um bairro de classe alta dividido entre construções antigas e prédios comerciais, uma única casa permanecia em pé, apoiada em uma torre de terra.
Observou por mais algum tempo e saltou sobre alguns destroços e pedras que davam segurança para pisar firmemente e formavam uma escada detalhadamente construída na encosta para se parecer ocasional. Começou a descer quando um pássaro planou ao seu lado e foi na direção da casa, onde duas pessoas conversavam como se nada tivesse acontecido.
– Precisava mesmo de tudo isso? – O homem perguntou sentado enquanto carregava uma bandeja com duas xícaras e chá em um bule de porcelana.
– Você deveria agradecer que não acabei com você também – Ela respondeu enquanto secava os cabelos com uma toalha felpuda – Há quanto tempo estou aqui?
– Uns cinco meses. Não foi nada fácil proteger o seu corpo.
– Imagino se tivesse tentado de verdade – Comentou enquanto recebia uma xicara de chá quente.
– Se tivesse tentado de verdade, todo meu plano iria por água abaixo. Você poderia ao menos agradecer por eu não ter deixado que te estuprassem, tirassem fotos e todas essas coisas. Um pouco de consideração não iria te machucar. E além do mais, é só você se concentrar que todas essas marcas de pancada e cortes vão curar em um segundo.
– Não quero. Eu vou atrás do responsável por tudo isso e vou acabar com ele. E você vai me ajudar.
– E se o responsável for eu?
– Eu duvido. Nem em mil séculos sua natureza mudou. E eu não preciso fazer nada para ver isso.
– Nem a sua mudou, Holo. Mesmo assim, ainda me dói o caminho que você escolheu.
– Até onde sei não te devo satisfações.
– Mas deve a si mesma.
– Não começa Max, não depois de tanto tempo.
– Fica quieta. Tem alguém chegando.
– Como você?
– Eu aprendi alguns truques. Agora fica aqui, ainda não faço ideia de quem seja.
– Mas como que alguém vai chegar até aqui tão rápido? Não era para ninguém conseguir chegar até aqui. E não me manda ficar quieta.
– Acho que deixei baterem muito na sua cabeça. Pensa direito, só estamos nós dois aqui.
– E daí?
– Com a explosão que você causou, só tem um jeito de alguém chegar até aqui.
– Sendo um de nós.
– Exato. Consegui rastrear. Me diz que você já recuperou sua força.
– Ainda não, preciso comer alguma coisa, por quê?
– Teria sobrado algum poder da Banshee se você não fosse tão cabeça quente. Bem, se lembra da Senhora dos Pássaros?
– Qual das três? A que não gosta de mim, a que não gosta de você ou…
– A que não gosta de nós dois.
– Jasmine…
– Eu vou até a porta. Eu vou trancar a porta, não sai daqui por nada.
O grito de uma águia ecoou nos cômodos com poucos móveis enquanto uma sombra escurecia as janelas. A campainha tocou quase ao mesmo tempo em que a porta se abriu.
Uma garota com quase dezessete anos estava do outro lado, sorridente como uma criança. Assobiou e um pequeno pardal pousou em seu ombro, obediente.
– Oi Max, posso entrar?
– Por favor, só não tenho móveis confortáveis. Na verdade, quase não tenho móveis.
– Sem problemas. O bom é que você está bem não é? Olha só a bagunça que ficou esse bairro. Você deu sorte que nada aconteceu com sua casa, não é?
– Sim, claro. Acho que vou ficar famoso por isso.
– Com certeza, vai ter que dar muitas entrevistas também. Seria bom ter uma jovem bonita te acompanhando. Por isso vim com essa forma, você gostou?
– Jasmine…
– Relaxe um pouco Max. Até parece que está escondendo algo.
– Foi um dia fora do padrão. Só estou um pouco tenso por causa dessa cratera estranha.
– Sei bem como é. Bom, eu posso te ajudar a relaxar um pouco.
– Estou bem, não se preocupe.
– Ora, vamos. Uma casa dessas sempre tem uma banheira.
– Infelizmente não vai servir para muita coisa, a explosão levou embora os canos de água e os cabos de energia elétrica.
– Que pena Max, queria tanto resolver nossas últimas pendências.
– Parece que vou ficar te devendo.
– Parece que sim. Mas foi bom saber que você está bem. E agora sei seu endereço, veja se não some de novo heim.
– Não vou, pretendo ficar aqui por algum tempo.
– Que bom. Mas Max, você pode me responder uma coisa?
– Claro.
– Se teve uma explosão, como que somente a sua casa ficou em pé?
Ele fechou os olhos desejando ter prestado mais atenção no jogo em que estava.
– Onde ela está Max?
Ele realmente desejou ter prestado mais atenção naquele jogo de palavras e sedução fútil.
– Não me faça contar até três.
– Espera um pouco Jasmine.
– Até mais tarde, querido. Dois e três.
O pequeno pardal saltou do ombro da jovem de olhos castanhos e voou para fora, empurrando o dono da casa, cratera adento.